Exposição artística em Santiago do Chile ativa arquivos de violência contra gays, lésbicas e trans

A exposição "Multidão Marica. Ativações de arquivos sexo-dissidentes na América Latina", no Museo de la Solidaridad Salvador Allende, na capital chilena, busca reviver a memória precária e fragmentada de atos de violência, repressão e perseguição que ocorreram contra homossexuais e transgêneros ao longo dos séculos XX e XXI na América Latina.

Exposição "Multidão Marica" - Foto: Tiago Elídio

Artistas e ativistas de oito países latino-americanos foram convidados a recuperar e ativar estes episódios, que haviam sido relativamente relegados a um segundo plano, imersos em uma narrativa hegemônica das políticas oficiais locais e em uma trama colonial de políticas sexuais globais.

A fragilidade destes arquivos sexo-dissidentes abriu assim a possibilidade de reinventá-los, ficcionalizá-los e rememorá-los como modo de construir relatos próprios. O arquivo, enquanto repositório de uma memória oficial, torna-se performático e ao mesmo tempo um lugar de encontro para a reinvenção de um latino-americanismo trans, lésbico e marica, podendo propor outras formas de conhecimento e experiência que não respondam ao modelo hegemônico da perspectiva eurocêntrica, logocêntrica e falocêntrica da modernidade ocidental.

Obra de Pêdra Costa e Taís Lobo representando o Brasil - Foto: Tiago Elídio

"A partir de nossa posição marica, dialogamos com xs outrxs maricas, travestis, lésbicas e trans que participam desta mostra. Nesse sentido, o panorama ‘latino-americano’ aqui presente não dá conta de uma totalidade, mas de fragmentos afetivos e afetados da história e do presente para ativar as violências e resistências dos movimentos sexo-dissidentes em oito países ao longo do século XX”, explicam os curadores Francisco Godoy Vega e Felipe Rivas San Martín.

A mostra fica em exibição até o dia 13 de agosto no Museo de la Solidaridad Salvador Allende. Os artistas participantes são: Pao Lunch (Argentina), Pêdra Costa e Taís Lobo (Brasil), Cuds Chile (Chile), Leticia Rojas (Equador), Lia Garcia (México), Elyla Sinvergüenza e Miranda de las Calles (Nicarágua), Erwing Szokol (Paraguai) e Hector Acuña/Frau Diamanda (Peru).

Obra de Miranda de las Calles, representando a Nicarágua - Foto: Tiago Elídio

O Museu de la Solidaridad surgiu em 1971, como forma de apoio ao governo de esquerda de Salvador Allende. Vários artistas internacionais doaram obras para criar um museu ao povo chileno. Depois do golpe de Estado de 11 de setembro de 1973, o museu foi fechado, e suas obras foram guardadas no Museu de Arte Contemporânea de Santiago. No entanto, no exterior, artistas se solidarizaram com o governo derrocado e criaram os "Museus da Resistência", cujas obras se uniram à coleção original quando a democracia retornou ao Chile e o museu foi reinaugurado em setembro de 1991 com seu nome atual.

Museo de la Solidaridad Salvador Allende - Foto: Tiago Elídio

A casa que abriga o museu atualmente, aliás, foi sede do Departamento de Estudos Humanísticos da Universidade do Chile no final da década de 60, início dos anos 70, sendo o epicentro da vanguarda artística e literária do país e enclave de resistência contracultural à ditadura. No entanto, em 1978, 5 anos após o início do regime de Pinochet, a casa se converteu em um centro de operações da Central Nacional de Informações (CNI), organismo de repressão estatal, perseguição, assassinato e desaparecimento de opositores políticos durante a ditadura militar no Chile. Somente em 2004 a casa se tornou a sede do museu.

Portanto, se vai viajar ao Chile e passar por Santiago, vale a pena visitá-lo! Além dessa e outras exposições temporárias, o Museo de la Solidaridad Salvador Allende é um dos principais difusores de arte moderna no país, com uma coleção com mais de 2.700 obras. Para mais informações, é só acessar aqui a página oficial.

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