Ganhadora de um Nobel, a chilena Gabriela Mistral é um importante nome da literatura latino-americana

Primeira pessoa da América Latina e primeira mulher americana a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, em 1945, a poetisa, diplomata e pedagoga chilena Gabriela Mistral foi uma das principais figuras da literatura chilena e latino-americana. E nos últimos anos, veio a público a confirmação de sua relação amorosa com a americana Doris Dana.


Quando recebeu a notícia sobre o prêmio, Gabriela estava residindo na cidade brasileira de Petrópolis, onde desempenhava o cargo de consulesa chilena desde 1941. O Prêmio Nobel fez com que ela se tornasse uma figura de destaque na literatura internacional e a levou a viajar por todo o mundo e representar seu país em comissões culturais das Nações Unidas, até falecer, em 1957, nos Estados Unidos.

Ao longo da vida, teve algumas relações íntimas com mulheres, sendo a mais conhecida a que teve com a americana Doris Dana. Em 2010 foi lançado o documentário "Locas Mujeres", de María Elena Wood, sobre essa relação, que até então era pouco conhecida e admitida publicamente. Somente após a morte de Doris, as correspondências trocadas entre as duas vieram a público, explicitando o relacionamento, que até então era mantido oculto.

Gabriela Mistral e Doris Dana

A vida de Gabriela foi marcada por alguns episódios trágicos, como os suicídios de um namorado e do sobrinho que havia adotado como filho. Assim, os temas centrais em seus poemas são o amor, o amor de mãe, memórias pessoais dolorosas, mágoa e recuperação, sempre com muita emoção.

“A julgar pelas narrações de Gabriela, sua vida estava repleta de feitos assim, estranhos, paradoxais, que pareciam para ela cheios de significados, como se a vida fosse uma rua com esfinges de ambos os lados, e cada uma delas, ao propor seu enigma, entregasse a respostas das restantes”, afirmou Cecília Meireles, poetisa carioca amiga de Mistral.

Gabriela Mistral e Cecília Meireles

Estranhamente, apesar de ter vivido no Brasil e ter recebido o Nobel 21 anos antes de seu conterrâneo Pablo Neruda, não há nenhuma publicação sua por aqui. Por isso, ainda hoje é um nome pouco conhecido no Brasil, ao contrário do de Neruda.

Em Santiago, um importante centro cultural leva seu nome. Aberto em 2010, o Centro Gabriela Mistral abriga eventos de teatro, dança, música clássica e popular, artes visuais e arte popular. Com 22 mil metros quadrados e 10 salas, seu objetivo é articular conteúdos, cultura e experiências.

Centro Cultural Gabriela Mistral - Foto: Tiago Elídio

Abaixo um poema de Gabriela Mistral traduzido ao português.

Beijos

Há beijos que pronunciam por si sós
a sentença de amor condenatória,
há beijos que se dão com o olhar
há beijos que se dão com a memória.

Há beijos silenciosos, beijos nobres
há beijos enigmáticos, sinceros
há beijos que só as almas se dão
há beijos que, por proibidos, verdadeiros.

Há beijos que calcinam e que ferem,
há beijos que arrebatam os sentidos,
há beijos misteriosos que deixaram
mil sonhos errantes e perdidos.

Há beijos problemáticos que envolvem
um segredo que nunca decifraram,
há beijos que causam a tragédia
quantas rosas em broche sem folhas ficaram.

Há beijos perfumados, beijos tíbios
que palpitam em íntimos desejos,
há beijos que nos lábios deixam marcas
como um campo de sol entre dois gelos.

Há beijos que parecem açucenas
por serem sublimes, ingênuos e puros,
há beijos traiçoeiros e covardes,
há beijos malditos e perjuros.

Judas beija Jesus e deixa impressa
em seu rosto divino a felonia,
enquanto Madalena com seus beijos
fortifica piedosa sua agonia.

Desde então nos beijos palpita
o amor, a traição e as dores,
nas bodas humanas, se parecem
com a brisa que brinca com as flores.

Há beijos que produzem desvarios
de amorosa paixão ardente e louca,
você os conhece bem, são beijos meus
inventados por mim, para a sua boca.

Beijos de chama que, em rastro impresso,
os sulcos de um amor vedado levaram,
beijos de tempestade, selvagens beijos
que só os nossos lábios provaram.

Lembra o primeiro...? Indefinível;
fez sua face ruborizar
e, nos espasmos de emoção terrível,
encheu de lágrimas seu olhar.

Lembra que uma tarde em louco excesso
te vi ciumento imaginando injúrias,
te coloquei em meus braços… vibrou um beijo,
e o que você viu depois...? Sangue em meus lábios.

Eu te ensinei a beijar: os frios beijos
são de impassível coração de pedra,
eu te ensinei a beijar com meus beijos
inventados por mim, para a sua boca.

Tradução de Tiago Elídio.

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