Debate sobre arte e ativismos lés-bi-cuier abre a mostra sobre Barbara Hammer no Rio de Janeiro

"Procurar brechas para ocupar os espaços." Esta fala de Amora Moira resume bem o que foi discutido na mesa "Arte e Ativismos Lés-Bi-Cuier", que abriu a mostra "Barbara Hammer – Um cinema experimental lésbico" nesta terça-feira na Caixa Cultural do Rio de Janeiro. Além de Amara, autora do livro E se eu fosse puta, estiveram presentes debatendo a criação artística e o ativismo LGBTQ+ o cineasta Pri Bertucci, do projeto [SSEX BBOX] - Sexualidade Fora da Caixa, e a poeta Tatiana Nascimento, com mediação de Juliana Pamplona.

"Arte e ativismos Lés-Bi-Cuier" - Foto: Tiago Elídio

A mostra, em cartaz entre os dias 18 e 30 de abril na Caixa Cultural, traz, pela primeira vez ao Brasil, um conjunto de 24 filmes da pioneira diretora americana Barbara Hammer, que ficou famosa como umas das cineastas que mais explorou a cultura lésbica na sétima arte. Abordando assuntos tabus sob a perspectiva de uma artista homossexual assumida desde os anos 60, sua filmografia se destaca por uma marca estética repleta de experimentações desviantes das convenções narrativas.


Durante a mostra, o público poderá conferir produções de diversas fases da obra da diretora: dos sexualmente irreverentes curtas do início de carreira, a exemplo de Dyketatics, Superdyke e Menses, a filmes-ensaios ousados, como o premiado Nitrate Kisses e The Female Closet, que resgatam histórias invisibilizadas de LGBTQ+. Foram selecionados, ainda, filmes que homenageiam outros artistas, como Resisting Paradise, que aborda o trabalho de Henri Matisse e Pierre Bonnard durante a Segunda Guerra Mundial.

Cena de The Female Closet

“É muito importante trazer o trabalho da Barbara para o Brasil nesse momento em que questões LGBTQ+ são discutidas de maneira intensa em meio a ondas de conservadorismo e lutas pela validação de modos plurais de viver a sexualidade e o amor”, ressalta uma das curadoras, Juliana Pamplona. “Nossa proposta com o evento é endereçar a urgência de enfrentamento de tabus sociais, em especial a invisibilidade lésbica, e oferecer uma experiência estética de alta qualidade para um público ávido por um cinema de vanguarda queer”, complementa Marina Pessanha, a outra curadora da mostra.

No dia 27 de abril, será realizado outro debate, "Olhares sobre o Cinema de Barbara Hammer", com a participação da crítica Camila Vieira da Silva e das cineastas Susana Costa Amaral e Érica Sarmet e a mediação da curadora Marina Pessanha.

Para conferir a programação completa, é só acessar o site da Caixa Cultural ou a página da mostra no Facebook.


E para finalizar, a bela poesia de Tatiana Nascimento declamada durante a mesa "Arte e Ativismos Lés-Bi-Cuier":

cuíer paradiso:

pra mim,

o paraíso cuíer podia ser um lugar muito simples:
encostar a cabeça no meio das suas teta, ou
te receber no meio das minhas coxa

e depois ir ali na padaria contigo, tomar um suco
(laranja com banana y açaí),
passar a mão no seu cabelo (te reconheci
pelo seu “corte preciso”)

sem ter que usar armadura,
sem ter que antecipar resposta,
sem ter que aprender como dá murro e nem
mapear o espaço antes de entrar

pra ver quem tá lá
imaginar
que ameaças eles fariam
quantos são
se viram a gente, se nos seguiriam

pra mim o paraíso cuíer podia ser menos burocrático que
casamento igualitário regulado pelo estado
(porque é o mesmo estado que paga
a polícia, lembra?)

podia ser menos desesperado que a paixão inteira num dia só
(calma,
amanhã eu
posso vir aqui, y
depois de amanhã a gente vê, mas quando você vier
eu vou gostar de te ver)

podia ser menos agoniado que vinte reuniões na mesma semana
(com palavra de ordem / questão de ordem
contra todas as ordens mas
organizando tão igual…)

podia ser menos vigiado que todomundo perguntando se é aberto ou fechado,
ou como a gente tá junta de novo se já tinha terminado,
ou “c num sabia que ela tinha um namorado?”

podia ser menos tudo que dá esse cansaço, essa desesperança, essa desconfiança
pra mim um paraíso cuíer podia ser mais tranquilo, mais respirado
podia ser eu y você num dia ensolarado

(mesmo que daqui a pouco fosse cada uma pra um lado;
eu ia gostar. ah, e a parte do pecado, essa parte
eu ia gostar também)

eu tô tão cansada de ter que corrigir o mundo inteiro na minha cabeça y ele
continuar errado… de tentar resistir, responder (sem esquecer de dançar,
de sorrir) e ver que eu vou morrer sem nada tá mudado,
mudado mesmo

pra mim o paraíso cuíer ia ser deitar um pouco do seu lado, ver
seu rosto dançando na fumaça, a cortina respirando sua janela, pulmão

a céu aberto: exposto, delicado,

mas forte.

sentir seu coração conversar com a pele do meu ouvido enquanto a noite vira dia

y a rua esvazia o silêncio com aqueles barulho de dia acordando, pássaros avisando, vizinho

cantando cedo, transporte público começando tarde (afinal, é o DF)… um pouco de qualquer coisa que me traga a coragem da sua

calma

Comentários

Newsletter

Postagens mais visitadas

Facebook